Sou rubro-negro há vinte e um anos. O que pode parecer pouco à velha geração. Mas, insisto, é tempo suficiente para saber como as coisas funcionam por essas bandas. E nesse tempo, é fácil perceber a alegria inata e inocente do torcedor do Flamengo. Cada vitória é comemorada como um título, ao passo que cada derrota é chorada como o fim do mundo. É um terreno de extremos, de difícil compreensão aos não-iniciados nessa arte de ser um torcedor de futebol. Os três pontos num fim-de-semana podem, na cabeça no rubro-negro, significar que o seu time é melhor do que a própia seleção brasileira. Isso pode até soar exagerado, mas é apenas o que o pequeno sussurro diz ao pé do ouvido do torcedor. Nesse embalo, qualquer vitória é o pontapé inicial para algo maior. Na mente do flamenguista, esse algo maior sempre é e será Tóquio. A conquista do mundial de 1981 permanece viva na memória de quem viveu ou não aquele momento. E como se não houvesse passado, presente ou futuro. E como se o Flamengo, a partir daquela conquista, fosse eternamente o campeão do mundo. A simples vitória do fim de semana, seja contra o Olaria, o Figueirense ou o São Paulo, fosse o passo inicial para confirmar a máxima do domínio do mundo pelo rubro-negro. Tóquio é a representação da vontade de poder do flamenguista.
Como já repetimos, “Rumo a Tóquio”, ao final de cada partida vitoriosa no Maracanã. E nesse meu curto tempo, nunca vi o Flamengo tão embalado como em 2007. Foi a melhor participação do time num campeonato brasileiro desde a última conquista nacional em 1992. Estávamos na zona de rebaixamento, e num instante, com a torcida lotando o maraca, pulamos para terceiro. Só não fomos campeões por que não deu tempo. O próprio presidente Márcio Braga disse isso. Ah se a nossa reação tivesse começado algumas rodadas mais cedo. Ainda assim, fomos para a Libertadores. Mais uma vez iríamos disputar a maior competição do continente. Uma das maiores do mundo. Para o flamenguista, um mero estágio antes da consagração máxima no Japão. Em 2008, tudo ia bem. Campeão estadual. A primeira fase da Libertadores no papo. Até que o Brasil assistiu ao maior e mais doloroso maracanazo. Fomos eliminados da Libertadores. Mas não foi uma derrota qualquer. Tínhamos ganhado na quarta-feira, no México, do time deles por 4x2. Abrimos dois gols de vantagem. No domingo, batemos o Botafogo e conquistamos o Estadual. Aquela quarta a noite era de festa. Nosso técnico, o da arrancada do Brasileiro, do título do Estadual, da Libertadores, estava se despedindo, iria para a África do Sul comandar a seleção anfitriã da Copa do Mundo de 2010. Aquela quarta seria de festa. O outro time, último colocado do campeonato mexicano, com dois gols de desvantagem, não seria adversário para o Flamengo. E não foi. O Flamengo dominou toda a ação da partida. Eles só subiram ao ataque três vezes. O Flamengo não conseguiu fazer nenhum gol. Eles conseguiram fazer três. Fomos eliminados.
Desde o dia sete de maio, o Rio vive de luto. O Flamengo tem um número considerável de torcedores para por a cidade de luto. A derrota era ainda maior ao ver os outros times da cidade indo bem em suas competições paralelas. Os rubro-negros ainda assistiram a Vasco e Botafogo chegarem as semifinais da Copa do Brasil. Era a possibilidade de uma final carioca, e a certeza de um rival na Libertadores. Da onde o nosso time havia sido defenestrado. Felizmente, ambos foram eliminados pelo Sport e Corinthians, respectivamente. Mas, o inferno ainda não tinha acabado. Desde 1985, dois times cariocas não participavam da Libertadores. Na época, ambos caíram na primeira fase. Agora, não. Nós havíamos ido até as oitavas. Mas, o Fluminense continuava, contra tudo e contra todos. Eles estavam na final. Era o pequeno e insignificante time, com um mísero título brasileiro (nós temos cinco) querendo igualar nossa maior marca. Eles também queriam Tóquio. Era o inferno sem fim do flamenguista.
O pequeno detalhe. O Flamengo vive o seu melhor momento na história recente do campeonato brasileiro. Dos últimos vinte anos, no mínimo. Ele é, após oito rodadas, líder isolado, com o maior número de vitórias, o melhor ataque, o melhor saldo de gols. Ainda tem o vice-artilheiro, coisa rara por aqui. Motivo mais do que suficiente para todos gritarmos: “Rumo a Tóquio”. Mas a cidade está de luto. Não há uma única camisa do time pelas ruas. Ninguém tem coragem de comemorar o melhor campeonato da equipe. O Flamengo está enterrado sobre seu orgulho. Enquanto a dor de acompanhar o rival chegar cada vez mais longe no campeonato que era para ser seu, o rubro-negro não terá motivos para sorrir. A torcida leva para a arquibancada a faixa: “Brasileiro é obrigação”. Nos somos lideres. A obrigação está sendo comprida. Mas o que é obrigação não se comemora, não se parabeniza. O Flamengo está crescendo está se impondo a vencer. O Flamengo que é maior do que tudo, chegou ao patamar máximo de sua grandeza. Não comemora mais vitórias. E como se tudo, a partir de agora, fosse tão normal que não é digno de se comemorado. O Flamengo morreu para os flamenguistas. Morreu até o momento em que o tão insignificante rival que há pouco tempo estava na última divisão do brasileiro, na Série C, morra, definitivamente, para o futebol. Em cada garganta rubro-negra rasga, ainda que sem jeito, o grito: Vamos LDU!
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